Por Mario Osava
RIO DE JANEIRO, 15 jun (TerraViva) Economia verde é uma “forma hábil” de privatizar a água, denunciou o boliviano Pablo Solón, diretor executivo da Focus on the Global South, uma ONG asiática, numa das dezenas de atividades que inauguraram a Cúpula dos Povos, no âmbito da conferencia Rio+20.
A correta outorga de recursos hídricos, seja à agricultura, hidrelétricas ou distribuição urbana, seria o melhor caminho para evitar desperdícios. Entregar a água a uma empresa que pode vendê-la estimularia a eficiência, já que reduzir perdas aumenta o lucro. Essa é a economia verde aplicada à água, sustenta Solón. Evita-se assim termos mais controversos, como privatização e mercado da água.
Um relatório das Nações Unidas sobre economia verde aponta Israel e Austrália como exemplos, por suas leis que regulam os direitos proprietários sobre fontes hídricas, citou o ativista, que já foi embaixador do seu país na ONU.
Os movimentos sociais têm combatido a entrega dos serviços de água potável a empresas privadas, como ocorreu na vitoriosa “guerra” de Cochabamba no ano 2000. Agora o desafio é enfrentar um “novo estagio da privatização”, em que o serviço pode até continuar público, mas o recurso passa ao controle privado com um valor monetário, observou Solón.
O relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) argumenta que investimentos privados são indispensáveis, já que os Estados em crise não dispõem dos 198 bilhões de dólares anuais necessários para atender a crescente demanda mundial por água potável.
Só com “preços adequados” e garantias de um mercado rentável se pode atrair tais investimentos, na lógica econômica verde rejeitada por Solon e pela maioria das cerca de cem pessoas que passaram pela tenda em que se discutiu o “direito à água”.
Na Bolívia um processo popular vem elaborando um projeto de lei dos “direitos da Mãe Terra”, para “resgatar a experiência indígena de convivência com a natureza”, anunciou Maria Teresa Hosse, secretaria técnica da Plataforma Boliviana Frente às Mudanças Climáticas.
Trata-se de bandeiras com que Evo Morales se elegeu presidente, mas abandonou ultimamente, tendo tem adotado medidas “terríveis” que dividiram as organizações sociais do país, lamentou Hosse.
Afirmar os direitos da natureza deveria ser um objetivo da Rio+20, segundo Solón. Enquanto na Conferencia das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92, “o ser humano foi o centro”, agora é preciso reconhecer que “o centro são o ser humano e a natureza”, defendeu.
Sem respeitar os “ciclos vitais da água”, não haverá direitos humanos, mas “uma escalada de privatização e destruição das fontes hídricas”, advertiu.
Ao “direito à água para todos” se deve acrescentar “os direitos da água”, enfatizaram outros participantes. Encarar todas as questões, inclusive as econômicas, na “perspectiva da natureza e da água”, é uma das propostas que os participantes da oficina levaram à reunião plenária que ocorre na Cúpula dos Povos todas as tardes.
Fortalecer o direito humano à água, para que seja efetivamente levada à prática, com ampla informação à sociedade sobre seus indicadores, e combate à desertificação foram outras propostas discutidas.
Solon reconheceu que falta ao movimento de defesa da água aprofundar alguns temas, como as mudanças climáticas que estão atingindo os recursos hídricos de uma forma ameaçadora. E que a remuneração por serviços ambientais poderá dividir os defensores da água como bem público, tal como a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), dividiu o movimento indígena.
Os índios são contra a mercantilização das florestas, mas se lhes pagam por uma preservação que já vinham praticando, muitos o aceitam, ainda que isso signifique licença para poluir em outros países, em detrimento da humanidade, raciocinou o ativista.
Essa pressão através do dinheiro tende a se repetir na questão da água, previu. A preservação tanto das florestas como das fontes hídricas exige investimentos, admitiu, mas não deveria degenerar numa relação de negocio. O financiamento dessas atividades deveria provir de um imposto sobre transações financeiras internacionais, a chamada Taxa Tobin, concluiu. (IPS/TerraViva)
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