Por Fabíola Ortiz
RIO DE JANEIRO, 19 Junho (TerraViva) – O ano de 1992 foi o momento em que o mundo parou para discutir sobre desenvolvimento sustentável, mas nenhum acordo foi assinado em prol da preservação das florestas. Agora, duas décadas após, ambientalistas, alianças internacionais e organizações não governamentais se reúnem na Rio+20 para defender que os povos das florestas são os maiores protagonistas da preservação das áreas verdes no mundo.
O direito de comunidades tradicionais, indígenas e camponeses de acessar e gerir de forma sustentável os recursos das florestas está diretamente associado ao combate ao desmatamento, assegurou à IPS Jefffrey Hatcher, diretor do programa global da Iniciativa para os Direitos e Recursos (RRI, em inglês Rights and Resources Initiative).
“Pesquisas mostram desde 1992, que as comunidades que tem garantidos seus direitos de acesso à terra onde habitam, previnem o desmatamento em suas áreas e ainda recuperam a mata de forma muito mais eficiente. Há uma relação direta entre garantia desses direitos e redução das emissões pelo desmatamento e aumento o sequestro de carbono”, argumentou.
Duncan Macqueen, coordenador do grupo de recursos naturais do Instituto Internacional para o Ambiente e Desenvolvimento (IIED em inglês International Institute for Environment and Development), defende que o documento final da Rio+20 deveria incluir uma “meta ambiciosa” para entregar o controle das floretas aos povos locais.
A RRI lançou, durante a Rio+20, o relatório “Quais direitos?” (What Rights?), uma análise comparativa da legislação nacional de países em desenvolvimento a respeito dos direitos de posse de comunidades tradicionais, indígenas e povos da floresta.
O estudo fez um levantamento de 27 países no mundo em todos os continentes que representam 75% das florestas no mundo e observou que 59 leis foram aprovadas desde 1992.
Em muitos países, a Rio92 teve uma influência direta na aprovação de legislações no sentido de garantir direitos de posse aos povos tradicionais, como no caso do Nepal.
Nos anos 80, Nepal tinha o pior índice de desmatamento no mundo. A partir do momento em que o governou optou por dar o controle de 25% das áreas verdes às comunidades tradicionais, o cenário reverteu-se expressivamente em um período de 10 anos.
As florestas cobrem 30% da área do planeta e mais de 1 bilhão de pessoas tiram seu sustento delas.
Nas últimas duas décadas, avanços foram observados na criação de leis e no reconhecimento dos direitos de comunidades e populações locais que vivem nas florestas, enfatizou Hatcher do RRI.
No entanto, os avanços foram diferenciados em cada região. A América Latina concentra o maior número de leis responsáveis por garantir a maior parte dos direitos às comunidades tradicionais à terra. O destaque vai para o Brasil, México, Colômbia, Bolívia e Peru.
“As comunidades que vivem nas florestas tem mais possibilidade de atuar nos recursos e explorá-los de forma comercial de modo sustentável”, destacou o diretor da RRI.
Porém, na África, o panorama é o inverso. Os governos africanos ainda detém o poder de 97% das florestas do continente.
“Apenas 2% das áreas verdes são de posse de comunidades tradicionais. As leis no continente africano não são implementadas, em alguns casos por questões técnicas, ou por falta de vontade política de implementá-las, ou ainda pela falta de recursos financeiros”, explicou.
O país que está na lista dos piores no quesito garantia de propriedade das comunidades locais é a República Democrática do Congo. O código florestal do país de 2000 permite dar o titulo da terra às comunidades que vivem em florestas, mas a regulação para implementar ainda não foi aprovada pelo Congresso nacional e segue tramitando há 10 anos.
E dessa forma, há muitas ameaças de corte ilegal de madeira, mineração, expansão de fronteiras agrícolas e concessões de títulos ilegais.
“O presidente da RDC já anunciou que esta é uma das prioridades de seu governo. Em julho, devem fazer uma conferência nacional sobre o tema para avançar e criar um mapa para viabilizar essas ações. É um bom sinal”, avalia Hatcher.
Outro país que apresenta legislação contrária às populações tradicionais é a Indonésia, na Ásia, onde não há qualquer reconhecimento dos direitos das comunidades locais que vivem na floresta. “A situação do país é similar a do Congo”, salienta.
G3 das florestas
Investir no controle das florestas pelos povos tradicionais onde lá vivem também é uma reivindicação do G3, grupo formado por três alianças internacionais que juntas compõem um quarto das florestas no mundo.
A gestão das florestas por povos tradicionais, sejam eles camponeses, indígenas ou comunidades, complementa às necessidades de preservação dos recursos hídricos, da biodiversidade, além de ajudar a reduzir a pobreza e ainda a melhorar qualidade dos que dependem das florestas para viver.
É o que defendem a Aliança Global das Comunidades Florestais (Global Alliance of Community Forestry), a Aliança Internacional dos Povos Indígenas e Tribais das Florestas Tropicais (International Alliance of Indigenous and Tribal Peoples of the Tropical Forest) e ainda a Aliança Internacional pelas Florestas Familiares (International Family Forestry Alliance) – que se autodenominam o G3 das florestas no livro “Investindo no controle local das florestas para a proteção das pessoas e do planeta”, lançado na Rio+20.
“Esta é a solução que propomos, dar direito aos que vivem nelas. Esta não é uma ideia teórica, há bons exemplos já sendo postos em prática”, disse à IPS Peter deMarsh, da aliança pelas florestas familiares.
Duncan Macqueen, coordenador do grupo de recursos naturais do Instituto Internacional para o Ambiente e Desenvolvimento (IIED em inglês International Institute for Environment and Development), defende que o documento final da Rio+20 deveria conter uma “meta ambiciosa” para entregar o controle das floretas aos povos locais.
“Para restaurar as floretas do mundo é necessário investir no empoderamento local das florestas. Achamos que esta recomendação deveria estar no documento final, mas dificilmente será colocada. O texto é negociado entre governos e nenhum quer se comprometer a uma meta tão ambiciosa em relação a florestas. Seria muito difícil que eles chegassem a um acordo sobre este tema”, admite Macqueen à IPS.
Já de acordo com Lennart Ackzell, representante também do G3, o controle local das florestas por comunidades é uma “ferramenta indispensável para o desenvolvimento da economia verde que tanto se discute na Rio+20”.
Sem este empoderamento, impera a falta de propriedade, o não incentivo para o cuidado e a preservação e a terra fica à mercê da corrupção e da ocupação ilegal, criticou Ackzell. (IPS/TerraViva)
(FIM/2012)