Por Fabíola Ortiz
RIO DE JANEIRO, 17 jun (TerraViva) – Enquanto os negociadores presentes na Conferência da Rio+20 enfrentam o impasse para chegar a acordos sobre formas de financiar a transição para a economia verde, já é possível ver exemplos na prática de ações que conseguem avançar no desenvolvimento de uma cadeia produtiva de baixo carbono e socialmente inclusiva.
Em eventos paralelos, como o Fair Ideas, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), promovido peloInstituto Internacional para o Desenvolvimento e Meio Ambiente (IIED), casos como o Bolsa Floresta no estado brasileiro do Amazonas apresentam a possibilidade de manter a floresta amazônica em pé e gerar renda para a sua população.
“Desde 2008, começamos a implementar o pagamento por serviços ambientais e significa que manter a floresta em pé vale mais do que derrubada. Esse é o nosso lema”, disse à IPS, a coordenadora geral do Programa Bolsa Floresta, Valcleia Solidade.
O objetivo desta política pública do maior estado amazônico tem como objetivo empoderar lideranças comunitárias que tradicionalmente vivem nas áreas de floresta, ensinar-lhes a melhor forma de retirar os bens e serviços ecológicos sem degradar a mata e ainda gerar renda para a sua sobrevivência.
“Temos o componente da renda para apoiar a cadeia produtiva como o extrativismo e tecnologia e assim aumentar a produção sem desmatar”, explicou Solidade.
Como maior estado brasileiro encravado no coração da floresta, o Amazonas tem hoje 73 unidades de conservação que ocupam uma área de mais de 38.8 milhões de hectares, um quarto da área do estado.
Em parceria com a Fundação Amazonas Sustentável (FAS), o programa Bolsa Floresta já é implementado em 15 unidades de conservação. Líderes comunitários que representam estes territórios viajaram mais de 12 horas do interior da Amazônia para o Rio de Janeiro, cidade sede da Conferência da ONU, a Rio+20.
É o caso de Raimundo Teixeira Amâncio, de 36 anos, que representa a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Piagaçu-Purus perto do município de Beruri, no centro-leste do Amazonas. Numa área de mais de um milhão de hectares, existem 57 comunidades onde vivem 4.000 pessoas.
Uma RDS é uma área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais adaptados às condições locais e que desempenham um papel na proteção da natureza e manutenção da diversidade biológica.
Amâncio recebe há quatro anos o pagamento do Bolsa Floresta. Pela primeira vez, o amazonense que nasceu e cresceu na Amazônia tem reconhecido seu papel de preservação da floresta e agora recebe estímulo para transmitir esse conhecimento aos seus quatro filhos.
“A gente vivia na floresta mal informado e agora a gente começou a entender que a Amazônia é o pulmão do mundo, e também ela é o coração do mundo e esse coração tem que continuar batendo. A floresta tem que se manter em pé, antes não tínhamos essa ideia”, admitiu à IPS.
Lá em Piagaçu-Purus, as principais atividades potenciais são o manejo de jacarés, do peixe Pirarucu e peixes ornamentais, além da produção comercial de farinha de peixe, manejo de produtos florestais não madeireiros como açaí, além de extração sustentável da madeira como andiroba, cedro, itauba e maçaranduba. A produção de mel, o artesanato e o ecoturismo são atividades que podem ser potencializadas na região.
“Já estamos começando a operar uma fábrica de processamento de castanha. De início, vamos beneficiar 2 mil latas, podendo ultrapassar a 10 mil por mês de castanha”, contou Amâncio.
O Bolsa Floresta no estado do Amazonas foi o precursor do programa do governo brasileiro chamado Bolsa Verde que concede incentivo financeiro às famílias em situação de extrema pobreza para desenvolver atividades sustentáveis. As famílias recebem a cada trimestre um benefício de R$ 300 (U$S 150).
O Bolsa Verde é destinado a quem vive em unidades de conservação e assentamentos da reforma agrária e beneficia mais de 16 milhões de pessoas na linha da extrema pobreza.
Contudo, há casos que, apesar do potencial favorável para serviços florestais, ainda há regiões da Amazônia que não carecem de recursos para desenvolver ações de economia verde.
É o exemplo do Amapá, estado com amplas possibilidades de viver a partir dos bens e serviços prestados pela floresta, mas ainda não deslanchou e permanece com indicadores sociais muito ruins.
O pequeno Amapá se localiza ao leste da Amazônia próximo à foz do Rio Amazonas no oceano Atlântico e à Guiana Francesa e detém 7% da Amazônia brasileira. O estado tem 80% de seu território com cobertura florestal e apenas 2% de desflorestamento. Mais de 70% da sua área é protegida.
No entanto, seus indicadores sociais apontam que apenas 13% da população do estado tem acesso a saneamento adequado e a renda média per capita não ultrapassa os R$ 525 (U$S 260).
Embora seja o segundo menor estado do país, a sua taxa de mortalidade infantil de até 5 anos é a maior do Brasil, 32 mortes para 100 mil nascidos vivos. O Amapá é o quarto estado com menor número de médicos por habitante, 0,99 para cada 1.000 pessoas.
A fonte de energia no estado amazônico também não é sustentável, 70% da geração energética provém da queima de óleo diesel, cuja combustão emite gases de efeito estufa.
Todos estes indicadores revelam o desafio para se aplicar uma economia mais verde e de baixo carbono numa região que apresenta alto potencial de serviços ambientais.
Apenas a cadeia produtiva do açaí, fruto amazônico principal produto florestal extraído no Amapá, movimenta divisas da ordem de R$ 500 milhões por ano (U$S 250 milhões). Em 2010, foram colhidos 1,4 toneladas de açaí.
Produtos como castanha da Amazônia, a borracha e o palmito também apontam para as potencialidades do estado.
A diretora do Instituto de Florestas do Amapá, Ana Euler, admite que o tema da economia verde ainda é novo mas que pode trazer oportunidades para a inclusão produtiva na cadeia deste modelo econômico mais sustentável.
“Temos que sair das discussões e ir para os setores de infraestrura, energia e produção. São necessárias novas políticas e incentivos que criem um ambiente favorável ao desenvolvimento desse nova economia”, disse.
O estado do Amapá já inicia uma parceria em conjunto com o Fundo Amazonas Sustentável e o IIED para começar a traçar os rumos da sustentabilidade. (IPS/TerraViva)
(FIM/2012)