Filha do Cacique Juruna busca as raízes do movimento indígena

Posted on 19 June 2012 by admin

Por Clarinha Glock

RIO DE JANEIRO, 19 junho (TerraViva) – Nos anos 70, o cacique Mário Juruna, do grupo Xavante, de Mato Grosso, tornou-se conhecido por sua luta pela demarcação das terras indígenas. Sua marca era um gravador, que ele carregava sempre consigo para comprovar as promessas dos políticos em suas peregrinações por Brasília. Juruna foi eleito o primeiro deputado federal indígena (1983 a 1987) e ajudou a criar a Comissão Permanente do Índio no Congresso Nacional. No acampamento indígena Terra Livre, que funciona dentro da área da Cúpula dos Povos, na praia do Flamengo, a xavante Samantha Rootsitsiná Juruna, 26 anos, filha do antigo cacique, busca as raízes ancestrais que justificam o movimento indígena atual. Samantha não precisa mais do gravador para cobrar soluções do Governo, já que há mais conscientização sobre a questão indígena do que no tempo do seu pai. Agora ela utiliza a Internet.

Samantha está completando o curso de Mestrado sobre Desenvolvimento Sustentável na Universidade de Brasília. Em seu trabalho de conclusão, vai analisar o movimento indígena na contemporaneidade, traçando um histórico a partir da Constituição de 1988. O acampamento Terra Livre será seu ponto de partida. “Essa grande manifestação do povo indígena é como se fosse uma assembleia, onde se reúnem os povos de todas as regiões, com diversidade de línguas e problemas, mas também de possíveis soluções”, explicou. Pretende entrevistar lideranças como Raoni e Damião Paradzané, entre outras figuras chaves para entender o processo de conquistas até hoje.

Indígenas reunidos no Rio de Janeiro já representam uma nova geração de lideranças. Crédito: Caroline Bennett.

Samantha quer saber se a concepção sobre o que é um movimento indígena  é algo comum entre os mais antigos, aqueles que saíram dos limites de suas aldeias para lutar em nome do povo. O significado de sustentabilidade para estas pessoas é igual ao dos mais jovens e dos não-indígenas? Está especialmente interessada em definir e encontrar ligações da sabedoria ancestral, espiritual e cultural com o movimento indígena contemporâneo, que é politizado. “Não dá para desvincular”, acredita. “O movimento indígena reivindica direitos de terra, saúde e educação. Como falar de saúde sem falar em sabedoria ancestral?”, questiona.

O acampamento Terra Livre – o nono realizado até hoje – é uma prova da força da mobilização, segundo Samantha. “Em Brasília teve um acampamento com 1,2 mil indígenas. Isso é um sinal de que a gente tem interesses comuns”, acredita.

O movimento virtual de que Samantha participa se comunica por meio da Rede de Juventude Indígena (Rejuind) e mantém um grupo de discussão pela Internet. “A gente usa a tecnologia para estar sempre em comunicação. Mas não somos nada sem esse conhecimento ancestral”, analisou.

Há um grupo fechado do Google formado por cerca de 200 indígenas e alguns integrantes do governo que atuam diretamente com os jovens indígenas e, no Facebook, são mais de 800 internautas conectados. “A maioria está estudando. Se não está na universidade, está na aldeia que tem acesso a Internet, e quer saber o que está acontecendo fora dali, porque às vezes ele só participa da discussão do seu Estado”, explicou Samantha. “Acredito que isso também faz parte do movimento indígena na contemporaneidade: utilizar as ferramentas tecnológicas para manter o diálogo”. Os jovens indígenas já tiveram um seminário próprio, organizado pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Um segundo encontro está para acontecer, provavelmente em novembro.

Embora não tenha convivido com o cacique Juruna durante o período em que foi deputado, porque ainda não era nascida, Samantha disse que aprendeu muito com o pai nos diálogos travados em casa.  “O ensinamento foi constante, não da política partidária em si, mas da política do diálogo, do respeito, do escutar. Você tem que saber o que seu parente quer – se você pode ajudar, faça. Você tem que respeitar o mais velho, porque ele é que sabe do conhecimento. Com o tempo, a gente vai vendo que realmente é aquilo. Então essa é a importância da transmissão da cultura, independente de estar na cidade ou na aldeia. Se a gente não respeita o conhecimento tradicional, não tem como ser xavante, ou caiapó… Essa é a essência”, garantiu. (IPS/TerraViva)

(FIM/2012)

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