Impedindo um tsunami no Himalaia

Posted on 22 June 2012 by admin

Por Julio Godoy

RIO DE JANEIRO, 21 de junho (TerraViva) Chewang Norphel é um herói improvável. Ele é um homem modesto, pequeno, quieto e pensativo, que não checa sua imagem cada vez que passa por um espelho. Há alguns anos, seus vizinhos até pensaram que ele era louco.

Agora, Norphel, um engenheiro civil  indiano que trabalha para o departamento de Desenvolvimento Rural (DRD) de Jammu Kashmir, em Ladakh, no Himalaia, é cumprimentado pelas mesmas pessoas que não o consideravam como um benfeitor. Durante a sua longa carreira no DRD, Norphel veio a perceber que a água que flui a partir das geleiras do Himalaia para baixo das montanhas estava mudando seus padrões, tornando-se erráticos. Em uma região onde quase nunca chove, e onde a população depende 100% da água das geleiras para irrigar as plantações de trigo e legumes, estes novos padrões irregulares de fluxo eram dramáticos.

O lago glacial Tso Rolpa, na região central do Nepal, tem crescido devido ao rápido derretimento da neve com o aquecimento global. Foto: Kishor Rimal/IPS

No final da década de 1980, Norphel projetou geleiras artificiais nos lados das montanhas perto de Ladakh, que seriam expostas à luz solar direta. Tanques colocados ao lado dos leitos dos rios, ligados a eles por canais, serviriam como reservatórios de água doce durante a primavera e o verão, e em seguida, congelariam durante o inverno, para serem liberados novamente quando necessário. A princípio, os vizinhos pensaram que os engenheiros haviam enlouquecido.

No entanto, quando a primavera e o verão chegaram e os reservatórios derretidos  forneceram um fluxo constante de água para a agricultura, a genialidade de Norphel foi finalmente reconhecida. Agora ele é conhecido como “o homem do gelo”, e saudado com gratidão pelos agricultores locais. A história de Norphel é um dos exemplos mais vívidos de como as pessoas estão lidando com as mudanças climáticas no Himalaia, e ao mesmo tempo, tornando possível o desenvolvimento sustentável.

A história é contada no documentário Revealed: Himalayan Meltdown, que foi apresentado no dia 20, no Rio de Janeiro, como um evento paralelo à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. “Estou feliz que minha ideia foi aceita pelas pessoas, e está servindo para ajudá-los agora”, Norphel afirma no filme. A mudança climática e o aquecimento global causados pelo homem estão colocando em risco as vidas de milhões de pessoas no Paquistão, Índia, Butão, Nepal, Bangladesh e China – pessoas que não emitem quase nenhum gás de efeito estufa, e não pode pagar por soluções caras.

Os impactos do derretimento do Himalaia são múltiplos. Embora os campos de trigo de Ladakh sofram com os fluxos erráticos de água glacial na primavera e verão, outras regiões são confrontadas com a possibilidade de que o derretimento provoque uma enchente devastadora. Este é o caso de um novo lago chamado Thortormi no reino do Butão, na encosta sul da Montanha Table, perto da fronteira com o Tibete. Ele é formado a partir de água que flui para baixo a partir do derretimento da geleira Thortormi, que até alguns meses atrás foi mantida no lugar apenas por uma represa de moraina, um material constituído por restos de rochas e lama.

As populações locais temem que o lago recém-nascido extravase seus limites, destruindo a moraina, e provocando o que os cientistas chamam de enchentes por explosão de lago glacial, ou GLOF na sigla em inglês, que são tsunamis mortíferos que fluem montanha abaixo. Um tsunami desse tipo já aconteceu em 1994, matando pelo menos 21 pessoas e destruindo plantações e aldeias. Com o apoio técnico e financeiro de organizações internacionais como a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), entre outros, as populações locais transformaram a moraina em uma barragem adequada.

Para fazer isso, cerca de 350 moradores locais, incluindo mulheres e adolescentes, trabalharam em condições extremamente difíceis para transportar ferramentas, pedras e outros materiais de construção até a montanha, cinco mil metros acima. O documentário mostra o grupo de trabalho até os joelhos em água glacial, carregando pedras e lama para refazer a represa. O lago Thortormi é um dos 24 lagos glaciais butaneses considerados instáveis. O país tem 2.674 desses lagos glaciais. No filme, Pradeep Mool, um engenheiro do Centro Internacional para Desenvolvimento Integrado das Montanhas (ICIMOD), sediado em Katmandu, Nepal, disse que, “graças a imagens de satélite, é possível identificar as geleiras mais perigosas. Contudo, é impossível dizer quando ou onde uma catástrofe vai acontecer”. Envolverde/IPS

(FIM/2012)

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