Por Clarinha Glock
RIO DE JANEIRO, junho 18 (TerraViva) – Enfeitada com um colar de penas e carregando um cartaz escrito à mão, Rosenilda Candido, 38 anos, indígena do grupo Terena, mostrou por que veio da aldeia Bananal, em Aquidauana, no Mato Grosso do Sul, ao Rio de Janeiro para integrar-se à Cúpula dos Povos.
Representando a Articulação das Mulheres Brasileiras, chegou tímida à Marcha das Mulheres realizada durante a manhã de ontem (18), mas com um discurso fortalecido pelos debates.
A lista de reivindicações de Rosenilda era semelhante a de outras milhares que fizeram a caminhada saindo do Museu de Arte Moderna até o Largo Carioca, no centro da cidade: não à violência, mais segurança nos territórios, demarcação de terras, direitos iguais com os homens. “O urbanismo está trazendo a exploração sexual para as aldeias, dificultando a plantação, provocando poluição e desmatamento”, observou.
A faixa alaranjada que carregou durante a Marcha trouxe o apelo da tailandesa Anchalee Phonklieng, 50 anos: “Mulheres da Ásia lutam por liberdade”. Anchalee reclamou da falta de oportunidades e disse que não há muito espaço de participação em seu país. “Podemos contribuir com conhecimento, opinião e informação”, garantiu. Poma Yola, 38 anos, integrante da Articulação Feminista Mercosur, vestiu as coloridas roupas típicas dos peruanos para lembrar que é preciso romper paradigmas e fortalecer os saberes.
A seu lado, Mary Marca Paco, diretora executiva do Centro de Informação e Desenvolvimento da Mulheres, com sedeem La Paz, na Bolívia, chamou a atenção para os riscos que corre a saúde reprodutiva humana devido aos efeitos nocivos dos transgênicos, da implantação de megaprojetos, da exploração de minérios, petróleo e energia. “Nossas crianças estão sendo violadas; as mulheres ainda enfrentam o tráfico humano, que as obriga à prostituição, e os abortos clandestinos”, explicou.
Estavam lá também as representantes da Via Campesina, bem como de instituições feministas e femininas, de partidos políticos, além de homens solidários.
O objetivo da Marcha, que conseguiu reunir gente de todos os cantos do Brasil e do Exterior, era dar visibilidade às diferentes vozes que durante muito tempo ficaram caladas e ainda hoje são caladas à força. Elas cantaram, batucaram, brincaram, portaram bandeiras, fizeram discursos e distribuíram panfletos à população. E, sobretudo, se fizeram ouvir: as mulheres são contra o modelo econômico que prioriza o lucro.
“Queremos denunciar essa falsa solução de economia verde e mostrar as alternativas construídas pelas representantes femininas em suas organizações”, comentou Bernadete Esperança Monteiro, integrante da secretaria executiva nacional da Marcha Mundial das Mulheres.
Noeli Taborda, 31 anos, da Via Campesina e da direção do Movimento das Mulheres Camponesas, lembrou que é possível construir um projeto de agricultura que de fato resolva o problema da alimentação no mundo. “Estamos organizadas, propondo a agricultura ecológica e a recuperação e melhoria das sementes crioulas, que são o início da vida. Não adianta ter acesso aos alimentos se eles estiverem contaminados. Os altos índices de câncer são resultado disso”, enfatizou.
Noeli falou contra as mortes – uma mulher assassinada a cada cinco minutos no Brasil -, e comparou a exploração sexual do corpo feminino com a da natureza – ambos são vistos como mercadoria. Sua expectativa é de que na Rio+20 os governos realmente pensem soluções que resolvam a crise ambiental e social.
“Gostaria que chegassem a soluções como a reforma agrária e a soberania alimentar através da agroecologia. Queria que os chefes de Estado pensassem pelo povo, e não apenas pela minoria de 5% que detém 40% das riquezas no mundo. Porém, acredito que a Rio+20 vai ser mais um encontro de fortalecimento das grandes economias e do capitalismo. Por isso a Cúpula dos Povos está aqui: para dizer que não queremos isso”.
Enquanto as mulheres faziam sua manifestação pela cidade, a diretora executiva da ONU Mulheres e ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet, e a ex-primeira ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, se reuniram no Riocentro e afirmaram a importância da participação igualitária e do respeito aos direitos das mulheres para o desenvolvimento sustentável. Segundo Bachelet, quando essa participação é total e igual, as sociedades, as economias e o meio ambiente ficam mais saudáveis.
Bachelet citou números que reforçam as denúncias e os apelos feitos durante a Marcha das Mulheres na Cúpula dos Povos. “Uma mulher morre a cada dois minutos de complicações do parto e da gravidez; a violência contra as mulheres continua uma epidemia global; as mulheres recebem menos que os homens pelo mesmo trabalho e continuam pouco representadas na tomada de decisões”, disse. Para Bachelet, isso não é sustentabilidade, é exclusão social e não fere apenas as mulheres, mas a todos. “Na Rio+20 temos a chance de mudar o futuro”, garantiu. (FIM/2012)
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