Por Julio Godoy
RIO DE JANEIRO, 18 de junho (TerraViva) Cúpulas gigantes como a Rio+20 podem facilmente degenerar em papo-furado e cenário para discursos inúteis.
No entanto, esses eventos também funcionam como vitrines de pequenos projetos que já melhoram a vida cotidiana das pessoas em algum lugar do nosso planeta azul. Este é o caso de vários projetos que usam fontes renováveis de energia no leste da África, que estão permitindo que as pessoas em pequenas comunidades substituam os insalubres lampiões de parafina, evitando acidentes e permitindo o abandono de métodos ineficientes e demorados para recarregar seus telefones celulares.
Em Uganda e no Quênia, uma pessoa tem estado profundamente envolvida com essa questão – um engenheiro de sistemas brasileiro, que migrou para a África oriental há 15 anos, apenas para perceber que o que ele tinha aprendido em casa era inútil do outro lado do mundo. “Eu logo percebi que teria de adaptar o meu conhecimento para as condições locais, se eu quisesse ser útil ali, e o que as pessoas precisavam não era uma logística eficiente, mas energia renovável”, disse ao TerraViva Izael Pereira da Silva, vice-chanceler para assuntos acadêmicos da Universidade de Strathmore em Nairóbi, no Quênia.
Além de suas responsabilidades acadêmicas, Pereira da Silva é um agente de desenvolvimento criativo, que fez a introdução e expansão de fontes de energia renováveis na África oriental, o trabalho de sua vida. Agora, ele voltou ao seu país natal para participar da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, e mostrar que a África não precisa ser o continente “escuro”. “Quando você voa sobre a África à noite, você não vê pontos de luz”, contou.
“Há alguns pontos brilhantes, na África do Sul. Mas na maior parte, o continente está às escuras. Isto pode ser alterado facilmente, com a geração de enormes quantidades de energia elétrica utilizando apenas fontes de energia renováveis, com emissões de carbono zero ou muito baixas”, destacou Pereira da Silva. Ele explicou que o Rio Congo sozinho tem a capacidade de gerar cerca de 150 mil gigawatts, usando várias pequenas centrais hidrelétricas, evitando assim as represas gigantes altamente ineficientes da terrível era Mobutu Sese-Seko. Tal capacidade seria suficiente para fornecer eletricidade para todo o continente.
“No entanto, os países africanos devem interligar e atualizar suas redes nacionais, para diversificar suas fontes de energia, usando a energia hidrelétrica, sol, vento e bioenergia”, opinou o engenheiro. “Dessa forma, o continente não seria dependente de uma fonte, para eliminar o risco de falhas em grande escala”, apontou. O engenheiro brasileiro disse que, “em 15 anos na África, eu quase nunca vi um dia inteiro sem sol. O continente deve usar essa fonte – a tecnologia de energia solar está madura, tanto na forma solar-térmica como fotovoltaica”.
Pereira da Silva mencionou o projeto Desertec, que visa a instalar grandes usinas térmicas a energia solar nos países do Magrebe e do norte da África, para atender todas as demandas de energia elétrica regionais, e ainda exportar uma parte substancial para a Europa. “Essas plantas também podem ser instaladas em toda a África. Parques de turbinas de vento também”, observou. Entretanto, antes de sonhar com um futuro brilhante para todo o continente africano, o brasileiro começou em pequena escala.
“As pessoas em Uganda e no Quênia usam lampiões de querosene e parafina para iluminar suas casas, quando poderiam usar lâmpadas movidas a energia solar”, sugeriu o engenheiro. Esses lampiões são de fato insalubres, ineficientes e extremamente caros. Segundo a Organização Mundial de Saúde, ocorrem mais de 300 mil mortes a cada ano por causa de queimaduras causadas por esses lampiões. Milhões morrem de câncer e outras doenças causadas pela fumaça emitida pelos lampiões. Além disso, as pessoas pobres gastam cerca de US$ 17 bilhões em querosene e parafina a cada ano para iluminar suas casas com lampiões.
Para substituir os lampiões, nós distribuímos para algumas comunidades em Uganda pequenos painéis solares, de dois watts de capacidade. Eles são o suficiente para iluminar uma casa por cinco horas, e ainda têm capacidade suficiente para carregar um telefone celular”, explicou Pereira da Silva. Sem esses painéis solares, os usuários teriam de se deslocar até a próxima vila, conectar seus telefones celulares na rede elétrica local, e esperar horas até que os dispositivos fossem recarregados.
Pereira da Silva também ajudou a conceber fornos solares, para cozinhar. “Nós também distribuímos 500 mil lâmpadas econômicas, para poupar eletricidade e reduzir as falhas da rede. As lâmpadas custaram US$ 1,6 milhão e permitiram uma economia de 30 gigawatts. Em 28 horas, o investimento foi pago pela economia de energia”, declarou. Para que esses projetos sejam bem-sucedidos, é necessário envolver as autoridades governamentais, o setor privado e entidades de pesquisa, tais como faculdades de engenharia, e as comunidades locais. “O tripé formado por Estado, empresas e universidades ajuda a iluminar a vida das pessoas comuns”, ressaltou. Envolverde/IPS
(FIM/2012)