Por Busani Bafana
RIO DE JANEIRO, 17 junho (TerraViva) – Sistemas integrados de paisagens que promovam mais a cooperação do que a competição podem acabar com conflitos globais sobre água, energia e uso do solo decorrentes da forma como o mundo produz alimentos, diz um novo estudo global.
“Hoje, o mundo está preso em um ciclo vicioso que envolve agricultores, governos, empresas e comunidades na busca de soluções estritamente definidas de curto prazo para os conflitos relacionados com alimentos, energia e água, na medida em que surgem”, disse Sara Scherr, uma das principais autoras do relatório, Paisagens para Pessoas, Alimentos e Natureza: Uma Visão e a Evidência, lançado em Washington esta semana.
A autora destacou que abordagens míopes de gestão de crise para a produção de alimentos fazem com que muitas vezes a solução de um problema agrave algum outro problema, por causa do ambiente complexo e mutável em que os alimentos são produzidos atualmente.
Com uma queda prevista na produção agrícola e na disponibilidade de água como resultado da mudança climática, os países em desenvolvimento em particular terão de aumentar sua produção de alimentos em 100% para alimentar dois bilhões de novas bocas em 2050.
“Paisagem integral” é um termo abrangente que se refere a uma grande coleção de abordagens para a gestão da terra e da água, que usam negociações multissetoriais entre as partes interessadas para aumentar a provisão de alimentos, serviços dos ecossistemas e bem-estar social, ao invés das trocas tradicionais de “ganha-perde” entre as partes.
De acordo com uma coalizão global recém-formada por organismos multilaterais de pesquisa e defensoria, conhecida como Iniciativa de Paisagens para Pessoas, Alimentos e Natureza, uma abordagem assim também ajuda a restaurar terras e recursos hídricos degradados.
A coalizão identificou mais de 300 iniciativas organizadas por paisagens onde alianças foram estabelecidas entre agricultores, fazendeiros, pastores, operadores de turismo, proprietários florestais, gerentes de conservação e empresas privadas.
Dados de 23 iniciativas de paisagem descritos no estudo mostram grandes impactos na produção agrícola, melhorias nos ecossistemas e benefícios para residências e comunidades na Costa Rica, Índia, Quênia, China e África.
Scherr, que também é presidente e CEO da Ecoagriculture Partners, uma coorganizadora da Iniciativa de Paisagens para Pessoas, Alimentos e Natureza, explicou ao TerraViva que o estudo foi desenvolvido a partir de uma revisão global de mais de um ano de sistemas de paisagem na América Latina, África e Ásia.
O estudo em curso também vai rever os sistemas nos Estados Unidos, Austrália e Europa. Ao defender a intensificação das abordagens de paisagem integral para acabar com os conflitos sobre água, energia e terra, Scherr destacou que o sistema tem potencial para permitir soluções criativas em disputas agrárias.
“Acredito que esta abordagem é particularmente relevante em áreas onde há questões agrárias delicadas, já que oferece um espaço para desenvolver soluções mais criativas que abordam as necessidades de vários usuários. Em áreas de governança muito pobre, a abordagem pode não funcionar bem, exceto no nível local “, observou Scherr.
Stephen Muchiri, diretor executivo da Federação dos Agricultores da África Oriental, ressaltou que a abordagem de paisagem integral tentou derrubar as cercas – em alguns casos, tanto no sentido literal como no figurado – que dividem as terras e os grupos que controlam a terra e a água.
No entanto, Scherr afirmou ao TerraViva que os mecanismos atuais de investimento, as políticas nacionais do setor e as políticas de posse da terra não apoiam soluções intersetoriais negociadas entre as partes interessadas, e muitas vezes atrapalham o caminho da ação.
“Nosso Chamado à Ação e nossa estratégia para a Iniciativa são mobilizar diretamente novos mecanismos de financiamento, políticas nacionais de apoio, o envolvimento das empresas em iniciativas de paisagem, e apoio técnico e de pesquisa para gerar resultados de paisagem integral”, explicou.
“Precisamos de uma estratégia integrada para a terra e a água que incorpore totalmente a gama de valores desses recursos para a segurança alimentar, energia, água, biodiversidade, mudança climática, e a abordagem de paisagem integral oferece um quadro estratégico para a discussão e para o desenvolvimento de planos de ação”, observou.
Falando sobre o lançamento do sistema, Achim Steiner, diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), afirmou que o mundo tem um apetite voraz por alimentos, água e energia, e alertou que um foco estreito em soluções específicas para o setor poderão em última análise levar ao desastre. “Não devemos perder a oportunidade da Rio+20 para estabelecer amplas abordagens integradas que atendam múltiplos interesses”, enfatizou. (FIM/2012)